30.12.10

Joséov


Em uma universidade do Brasil, dessas em que qualquer um entra e qualquer um sai sem o menor esforço, um renomado linguista búlgaro, desses que estuda América Latina, foi convidado para dar um breve palestra sobre a epistemologia da palavra, a fim de ajudar os alunos a compreenderem melhor a formação e a árvore genealógica das línguas faladas ao redor do mundo. Então ao começar a falar sobre as raízes das línguas asiáticas, o professor doutor é questionado sobre quais são as diferenças essenciais entre o japonês o coreano e o chinês, o professor começa a responder pacientemente, e quando chega o momento em que alega que, uma das principais diferenças entre o chinês e o japonês é que, enquanto os japoneses não usam o “L” nas palavras, os chineses não usam o “R”. Então um aluno levanta a mão e fala:



-Mas professor, eu tenho um primo que é japonês e se chama Luis.

Claudio Eduardo da Silva

26.12.10

Mil Conto de Natal

Primeiro de tudo, Feliz Natal! É sempre assim que o dia 25 de dezembro começa todos os anos, uma data maquiada, para um aniversário maquiado, conversei isso com a tia de um amigo meu em um desses natais. Ela já era formada em geografia fazia tempo e eu estava pensando entre História e Ciências Sócias, então meu amigo revelou que eu era ateu e tive que me explicar, até ai tudo bem, depois começou a velha discussão da data do Natal e da cor da pele de Jesus Cristo, como se isso mudasse a força do mito.


O Natal começou a ser desacreditado por mim quando eu tinha dez anos e comecei a perder espaço para as demais crianças da família, a família como não poderia deixar de ser se separou com o passar dos anos e, desde os 16 anos o Natal nunca mais foi o mesmo. Ainda bem acho que não existe data no ano em que eu me dedico mais a mim.

Eu saio, vou dar umas voltas na paulista vejo aquelas luzes de certa forma são bonitas. O que não é bonito é o falso sentimento natalino, nem vou repetir que já virou clichê, no entanto as coisas deviam ser mais honestas, tipo a mãe diz que odeia o pai e transa com outro ou vice e versa, o filho assumir que usa drogas de uma vez, as cunhadas se esbofetearem etc. Eu sei que isso é só um devaneio, o Natal não deveria ser assim, deveria era não ser um compromisso de família, a não ser que a família fosse apta a assumir esse compromisso.

Fazendo um balanço geral esse Natal até que foi bom, pelo menos sem querer eu consegui assistir um pedaço do filme Persépolis, que por sinal é muito bom. Além disso nas últimas horas do dia 25 consegui ir até a casa de um amigo meu, a família dele é super legal, ai nós bebemos conversamos, não sobre o nascimento de Jesus Cristo, mas sim sobre outras bobagens, até pulei corda, há quanto tempo eu não fazia isso. Em fim o Natal é sempre a mesma coisa pra mim, e tomara que ano que vem eu não esteja escrevendo um texto desses de novo.

Claudio Eduardo da Silva

13.12.10

Uma história trágica do Kardecismo

Era uma noite fria e escura, alguns pensamentos conturbavam minha cabeça de forma que eu só conseguisse pensar naquilo. Na noite anterior, o que ela havia falado entrou na minha cabeça e se alojou feito uma bala: “Essa noite o espírito do seu pai aparecerá como imagem que usa a água como espelho”. Estava desesperado, nada aparecia, já era quase meia noite e estava frio muito frio, ouvia-se o uivo de um cão longe, bem longe. Então quando menos esperava eu vi ali, refletido na água do vaso sanitário a imagem dele e logo, sem mais nem menos, lembrei das palavras da minha mãe: “Filho seu pai era um bosta”

11.12.10

Tom Zé Fabricado

Tom Zé sem dúvida é um dos maiores nomes da música brasileira. Muito elogiado e também muito criticado, seu estilo que mistura objetos do cotidiano urbano com música popular, faz com que muitas vezes seja incompreendido pelos ouvintes, assim como também muitas vezes é exaltado demasiadamente. Foi nesse contexto controverso do cantor que, Decio Matos Junior dirigiu o filme Fabricando Tom Zé. O filme retrata a vida do autor e traz também um retrato da sua turnê pela Europa, no filme também contamos com depoimentos de Caetano Veloso e Gilberto Gil, amigos de Tom Zé desde a tropicália, e também do cantor estadunidense David Byrne, esse responsável pelo “renascimento” do cantor de Irará.


O filme é bom, mas mais pelo próprio Tom Zé do que pela sua construção que ficou muito simples perante o sofisticado baiano. Tanto que uma das melhores passagens do filme é quando o músico relata um dos problemas que teve com a censura, o jeito com que ele relata a conversa com a censora e depois, imitando um menino cantando como ele diz “para o papai”, canta a música modificada. Encontramos outro desses devaneios engraçadíssimos no disco no jardim da política.

Embora, como filme, não seja nada fantástico, se torna interessante, pois mostra o músico sendo vaiado em um show na França. E além do mais é um filme que contém diversas passagens interessantes e que se torna não só uma aula de música experimental, mas também uma aula de tropicália.

Claudio Eduardo da Silva

1.12.10

Amarrom

A brincadeira de stop era famosa na década de 90, não que agora não seja, mas com certeza a sua freqüência diminuiu. E foi brincando de stop que tudo aconteceu. Costumava viajar para Mauá e região do ABC na minha infância, como a família da minha é enorme, eu tinha a sorte de sempre ter um primo para me acompanhar em brincadeiras. Um dia, cansados de brincadeiras de luta, eu e um primo mais velho resolvemos brincar de stop, sorteamos a letra deu “A”. Passados trinta segundos eu gritei:


-Stop!-meu primo continuou a escrever e eu protestei- falei stop parou!

Ele parou de escrever e continuou:

-Vamos lá, qual nome?- perguntou

-Armando, e o seu?

-Arnaldo- dez pontos para cada um e continuamos conferindo até que chegou na cor.

-Cor?- perguntou meu primo.

-Amarelo, e você?

-Amarrom.

-Amarrom? Que cor é essa?-perguntei indignado.

-Amarrom é a cor da madeira ué!

-Cor da madeira? A cor da madeira é marrom.

-É nada, é amarrom- a discussão seguiu e parecia não ter fim, de repente tive uma ideia, perguntar as nossas mães, mas essas não estavam em casa, então meu primo sugeriu:

-Vamos perguntar pra minha irmã!

-Sua irmã é mais burra que você!- retruquei

A discussão prosseguiu sem nenhum ruma concreto, até que eu concordei em perguntar para a minha prima:

-Joana- a chamei- fala pro seu irmão idiota, qual é a cor da madeira?

-Amarrom- era o que me faltava, como eram dois contra um aceitei a derrota. Agora, por que eles falavam amarrom? Não sei.

Claudio Eduardo da Silva

27.11.10

Zé Terceiro

Estavam dois amigos conversando, quando um terceiro se aproximou e falou para o primeiro se referindo ao segundo:


- Olha só- e mostrou um papel com um endereço eletrônico- o cara me fala pra eu ouvir Tom Zé, fala pra eu ouvir um tal de não sei o que Cage, e ainda quer que eu acesse o blog dele!

- Você tem um blog? Do que é?- perguntou o primeiro ao segundo.

- Tenho sim, e nele tem de tudo, mas até agora o que mais postei foram crônicas- respondeu.

-Nossa eu gosto de ler crônicas, são sobre o que?- perguntou o segundo enquanto o terceiro só ouvia.

-Dou preferência para as crônicas que falam sobre “Zés”, pois acho que todo brasileiro tem um pouco de Zé.

Então o terceiro ouviu e alertou:

-Só não vai escrever crônicas sobre Zé Paulo!

Claudio Eduardo da Silva

25.11.10

Zé Azar

O azar sempre lhe perseguiu, Zé não podia sair de casa de chinelo que pisava em alguma coisa ruim que, normalmente, sujava o seu pé todo. Certa vez comprou um guarda-chuva, daquele dos maiores e mais baratos, ao abrir, além de quebrar, a chuva parou. Com pouco esforço Zé conseguiu consertar com um clipe de papel, mas como para ele isso era pouco toda vez que saia com o guarda-chuva não chovia, e quando saia sem o céu desabava, só parava de chover quando chegava em casa, e se esquecia a chave ai a chuva não cessava.

Um dia desses ocorreu-lhe o cúmulo do azar. Zé tinha um braço operado que nunca sarava, foi fazer a milésima sessão de fisioterapia, dormira pessimamente na noite passada, pois seu cão de estimação não se cansava de latir com os cachorros da vizinhança, nada mais típico na sua vida. Porém o dia estava diferente, Zé havia ganhado um bom dia da fisioterapeuta, choveu enquanto se empossava de seu guarda-chuva com o clipe e pela primeira vez o ônibus chegava no ponto, depois dele, e com lugares para sentar e além de tudo isso, conseguiu pegar o ônibus no tempo certo da integração, sem pagar duas passagens como sempre acontecia.

Zé era só felicidade, talvez isso não seja nada para os outros, mas para ele os ventos estavam mudando de rumo. Zé subiu no bumba todo sorridente, escolheu seu lugar, no banco mais alto, encostou a cabeça na janela e dormiu como um anjo. Cinco minutos depois, o ônibus parou, aquele apito infernal de alguma coisa estava dando errada, o coletivo quebrou. Zé fez aquela cara de que os velhos tempos voltaram, mas não desistiu desceu do ônibus e aguardou o próximo, como todos tinham bilhete único ele logo pensou: “Vou me posicionar aqui, assim que o próximo ônibus abrir a porta da frente eu entro e sento de novo”. Porém como de praxe, o ônibus demorou meia hora pra chegar, quando chegou o ponto estava com mais pessoas. Zé se posicionou e correu para a porta da frente como se estivesse em guerra, correu pegou o bilhete e foi passar na catraca, quando levantou a cabeça viu, todos até os que não estavam no ônibus quebrado entrando pela porta de trás, mesmo assim ele sacou o bilhete único, este travou na primeira, quando finalmente Zé havia conseguido passar já não havia mais nenhum lugar sobrando e, além de sua passagem ser cobrada, ele foi em pé apertado, balançando, com sono e fome por pelo menos mais trinta minutos.



23.11.10

Meu amigo Luis

A lua brilhava forte no céu, apesar de, por momentos, ser coberta por algumas nuvens que passavam depressa, ao fundo a música Tristão e Isolda de Richard Wagner fazia a trilha sonora. Ela me aguardava sentada, quieta enquanto eu afiava a navalha e fumava meu cigarro. Aquele cenário me inspirava, apaguei o cigarro e me aproximei, encostei meus dedos em sua cabeça próximos aos seus olhos e me pus a fazer meu trabalho, enquanto isso pensava: “como é difícil ter uma namorada com barba”.

Claudio Eduardo da Silva

18.11.10

Zé Filósofo

Em algum bar da cidade, próximo a uma universidade, estava uma turma de estudantes e, entre eles, estava Zé. Um homem maduro, que de certa forma era até encantador, de fala bonita e certeira, era um típico universitário. Se aproveitava da sua condição de estudante de filosofia para fazer sua pessoa, sempre com frases clichês de filósofos clichês, quando na verdade pouco sabia a não ser coisas que qualquer que se interessasse um pouco saberia. Além de todo esse conhecimento sua aparência fazia jus ao seu intelecto, barba por fazer, óculos e cabelos meio compridos e desleixados, um típico estudante de humanas, daqueles que, ao revelar o que estuda, ouve: “Nossa! Você tem cara mesmo de filósofo”. Apesar disso tudo Zé possuía um dom, o de falar frases célebres em momentos de descontração ou de discussões à mesa de bar. E foi nesse contexto todo, que ele soltou uma dessas, em meio a uma acalorada e clássica conversa e exposições de opinião sobre as próximas eleições, Zé pediu a palavra e disse:


- Só vou falar uma coisa: Não vou falar nada!

Claudio Eduardo da Silva

17.11.10

As representações trazidas pela cidade: o sagrado e o profano


Quando tirei essa foto, dia 30 de outubro de 2010, pensei primeiramente e somente que, no mesmo lugar, mais exatamente na mesma rua, dois períodos se encontravam, o medieval e o contemporâneo. Fiz a foto durante o casamento de uma amiga, e a fiz em P&B (preto e branco) justamente pela beleza do estilo. Então ao entrar na igreja comecei a reparar em sua arquitetura, reparando que tudo que fora construído de um lado era exatamente reproduzido do outro lado. O chão, constituído de desenhos da Estrela de Davi, era feito de tal modo que essas começassem e acabassem sem serem cortadas, diferente de como costuma acontecer com alguns pisos nas casas de hoje em dia.

Então me lembrei de uma frase escrita no livro “O Nome da Rosa” de Umberto Eco, essa frase, proferida por um dos personagens do romance dizia que, a arquitetura era a única das artes que se fazia a partir do universo, ou seja, casas, templos, castelos, etc. eram construídos segundo a disposição dos astros. Como o templo deve ser uma representação, ou melhor, deve imergir o fiel em um ambiente sagrado, sua construção se comporta desta mesma forma, criando um ambiente simétrico e perfeito, não por questões técnicas, mas sim por questões sagradas. Aqui a arquitetura vai, antes de tudo, buscar imitar a obra dos deuses e, no caso católico, de Deus.[1]
Daí então, partirei para a análise do prédio ao lado da igreja, enquanto essa primeira foi feita segundo uma ordem espiritual, que muitos podem discordar. O prédio é uma construção laica, nele não se tem religião, não se tem representação espiritual e nem sacralidade. Nele busca-se uma simetria, no entanto essa não se remete a criação dos deuses ou do Deus, mas sim uma pura questão técnica. O que podemos notar nele não está muito além de que é uma construção civil ou comercial e que abriga inúmeras pessoas, embora se discuta muito os erros da Igreja Católica, e eu inclusive concordo com essa discussão, a construção laica ela é não mais do que uma construção que reflete uma nova sociedade – nova perante a sociedade da igreja- nela conseguimos ver um terreno bem aproveitado por um proprietário, onde fora construído, em vez de uma só moradia, várias que remete diretamente ao crescimento urbano acelerado e a supervalorização e aproveitamento do lote para fins comerciais.

Em fim, quando tirei a fotografia, não pensei que ela pudesse guardar tanta representação e uma reflexão que vai além da arquitetura. Afinal além de notarmos aqui o encontro de duas eras, encontramos em forma de arte a composição dessa nova sociedade, que possui forte a presença do consumo e uma dessacralização cada vez mais latente.

[1] ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano: a essência das religiões. São Paulo: Martins Fontes 2008

Claudio Eduardo da Silva

16.11.10

Meu último suspiro de Luis Buñuel

Quando nos deparamos com uma autobiografia, logo esperamos que vamos ler aquelas histórias de sempre e aquela autoexaltação. Mas o livro de Luis Buñuel sobre sua vida não é assim. Logicamente o autor fala muito de suas obras, porém faz mais críticas do que elogios, e critica muito mais ainda quem buscou entende-las. Quando começamos a ler a sua história começamos a ver que Buñuel se preocupa muito mais em relatar os episódios engraçados e os prazeres de sua vida.
O capítulo mais divertido e inusitado, talvez não tão inusitado para um surrealista, é Sonhos e Devaneios onde o cineasta vai relatar quando e quais sonhos ele costumava ter e os devaneios que tinha e como que influenciaram muito em sua obra. Buñuel também se mostra muito crítico à psicanálise, pois acha que essa é uma ciência das elites, além de dedicar um capítulo inteiro para falar de cigarros, mulheres e bebidas. Não só no âmbito de sua vida particular, Buñuel dedica um capítulo a um dos momentos mais importantes da Espanha do século XX, a Guerra Civil Espanhola, neste capítulo o cineasta vai nos mostrar seus ideais políticos e suas críticas aos movimentos de esquerda envolvidos no conflito. E por fim, um capítulo que vale destaque é o intitulado Ateu Graças a Deus, aqui o cineasta espanhol nos revela um ateísmo particular onde, segundo ele, acreditar ou não acreditar é indiferente. Sem dúvida uma obra que vale a pena, além de contar sobre a obra do maior cineasta e espanhol e o representante do surrealismo no cinema, também é divertida e engraçada.

Por Claudio Eduardo da Silva

12.11.10

MIL CONTO


Por que não falar de futebol?
Por que não falar de filosofia?
Por que não falar em espanhol?
Por que não em portunhol?
Por que não falar de Zé?
Zé Simão, Zé do Caixão e até o Tom Zé
Por que não falar de história, até das estórias da história ou até da história que acabou com a separação entre estória e história?
Por que não falar de tudo?
Por que não chamar os amigos pra falar de tudo, mesmo que às vezes esses não falem nada?
Por que transformar mil contos em mil conto?